quinta-feira, 27 de junho de 2013

Mais sobre os movimentos: outros diálogos

Compartilho aqui outros diálogos que analisam bem o movimento, e nos auxiliam a compreendê-lo de forma honesta e consistente. Vale a pena conferir.

Globo e os protestos
Vídeo sensacional. Didático e descontraído. E bastante popular também: possui mais de 1,6 milhão de acessos




Mauro Iasi
Vídeo do professor Mauro Iasi da UFRJ analisando os movimentos que estão nas ruas de forma acadêmica e de simples compreensão. 


Mais do professor Mauro Iasi no blog da Boitempo editorial

Pode ser a gota d´água: enfrentar a direita avançando o luta socialista

" Entendendo que a explosão é perfeitamente compreensível como forma de manifestação de um profundo descontentamento, sabemos que é mais do que isto. Representa, também, o esgotamento de uma forma que tem sido muito eficaz de domínio e controle político. Cultivamos um fetiche pela forma democrática como se ela em si mesmo fosse a solução enfim encontrada pela humanidade para superar um dilema histórico da ordem burguesa que a acompanha desde o nascimento e que não tem solução
 dentro da sociedade capitalista: o abismo entre sociedade e Estado (...)  

A revolta do senso comum
por Luciano Martins Costa no Observatório da Imprensa

" Há bandidos em meio às multidões, e seu número varia de cidade para cidade, mas pelo menos em São Paulo, até o vandalismo é politizado, fundamentado em leitura consistente e, segundo a conclusão do artigo, “expôs o despreparo da PM e dos governantes e acabou sendo decisivo na vitória das manifestações”. "

Blog do Juca



Vandalismo é o Cacete!
Trecho da entrevista do Boechat ao site patocomlaranja.com.br.



Aceito outras sugestões de referências.
Sobre este post, grato a Lino, Thiago e cia.

sábado, 22 de junho de 2013

Megaeventos e Manifestações

A tradução dos Megaeventos (em curso e futuros) foi realizada pelo grande "profeta" Raulzito há 30 e poucos anos atrás:

A solução pro nosso povo
Eu vou 
Negócio bom assim
Ninguém nunca viu
Tá tudo pronto aqui
É só vim pegar
A solução é alugar o Brasil!...

Nós não vamo paga nada
Nós não vamo paga nada
É tudo free!
Tá na hora agora é free
Vamo embora
Dá lugar pros gringo entrar
Esse imóvel tá prá alugar
Ah! Ah! Ah! Ah! Ah! Ah!...

Os estrangeiros
Eu sei que eles vão gostar
Tem o Atlântico
Tem vista pro mar
A Amazônia
É o jardim do quintal
E o dólar dele
Paga o nosso mingau...

Nós não vamo paga nada
Nós não vamo paga nada
É tudo free!
Tá na hora agora é free
Vamo embora
Dá lugar pros gringo entrar
Pois esse imóvel está prá alugar
Alugar! Ei!
-Grande Solução!...

Nós não vamo paga nada
Nós não vamo paga nada
Agora é free!
Tá na hora é tudo free
Vamo embora
Dá lugar pros outro entrar
Pois esse imóvel tá prá alugar
Ah! Ah! Ah! Ah!
Nós não vamo paga nada
Nós não vamo paga nada
Agora é free!
Tá na hora é tudo free
Vamo embora
Dá lugar pros gringos entrar
Pois esse imóvel
Está prá alugar...
(...)
Aluga-se. Raul Seixas e Cláudio Azevedo: Abre-te Sésamo, 1980.

Quem tiver alguma dúvida, basta consultar a  lei conhecida como Lei Geral da Copa, a qual estabelece plenos direitos à empresa organizadora da Copa das Confederações e da Copa do Mundo no que tange à exploração comercial e autoral, uso pleno e exclusivo de equipamentos públicos, de estruturas administrativas, subversão de leis vigentes, livre acesso e circulação em nosso país, alteração da organização urbana e administrativa do estado, administração pública e suas autarquias, os quais avalizam qualquer equívoco que houver em sua organização. E o "melhor": ao final do uso, tudo estará "à venda", ou quase isso, tudo será concessionado. Viva a cartilha neoliberal.

Isso é um baita motivo para haverem manifestações. E especificamente sobre a questão dos Megaeventos, existem notórias organizações que estabelecem uma frente de resistência como o Comitê Popular da CopaPortal Popular da Copa e das OlimpíadasComitê Popular Rio Copa e Olimpíadas, e outros. Mas acho necessário se apropriar do momento histórico, o qual vivemos coletiva e inalienadamente para que possamos intervir de forma construtiva como seres sociais, cidadãos e cidadãs. Sem essa de assistir de camarote.

Acredito que a maior parte daqueles que estão nas ruas gritando, levantando cartazes, tomando bala de borracha e sprayzada de pimenta na cara são estudantes. Talvez esse seja um de seus maiores papéis no cenário social: conhecer-apropriar-transformar. Na dialética do "apropriar" inclui-se uma sub-ação: manifestar. Essa é uma característica histórica dos estudantes, às vezes politicamente organizados, às vezes independentes. De fato, essa ação por muitas vezes intervêm na sociedade de forma a mobilizá-la. Temos diversos exemplos em nossa história recente, lembro-me da mais famosa aquela dos caras-pintadas, que acabou culminando no impeachment do Collor. O que se noticia na grande mídia é que este levante de manifestações não possui, aceita ou se vincula a grupos políticos organizados.

Outra notícia amplamente divulgada é que diversas e dispersas reivindicações tem sido agregadas nas manifestações: abaixo o aumento das passagens (movimento que acabou deflagrando pelo Movimento Passe Livre - MPL, a partir de São Paulo, seu grande levante), contra a PEC 37, contra a corrupção, a favor do movimento GLTB, contra o Feliciano, sei lá mais o que. Penso que, se isso constitui-se notícia verdadeira, o movimento tem a tendência de cair em um vazio conceitual e propositivo, pois temos muito a transformar na sociedade, muitas coisas estão equivocadas, e talvez apenas gritar contra elas não quer dizer que elas se transformem. Agregar diversas manifestações em uma grande rebeldia não dá elementos para que as coisas se transformem.  Vi no programa Agora é tarde do Danilo Gentili uma irônica esquete (como lhe é peculiar) sobre esse cenário: um monte de jovens reivindicando algo de forma desagregada, desorganizada, individual. Isso dá munição para à desqualificação do movimento no sentido de isso se traduza em mais um frisson da juventude.

A propósito, outra leitura evidente sobre isso, acompanhada através da mídia, é a exaltação dos "manifestantes pacíficos" e desqualificação dos "vândalos" que promovem quebra-quebra e arruaça. Entendo que esses movimentos agregam uma coalizão popular entorno da mudança política e da transformação social. A violência é uma manifestação humana, possui motivo e pode ser explicada por diversas leituras das ciências humanas. Desqualificá-la ao contrário de buscar compreendê-la é uma atitude reacionária e desonesta. E convenhamos, há muitos motivos que incentivam e explicam a revolta sob violência dessas pessoas. A usurpação do erário público para realização desses eventos é uma delas. Outra, o aumento da passagem do transporte público às vésperas de um evento internacional que limita a mobilidade urbana. Mas coalizão é assim mesmo, o todo acaba respondendo pela ação individualizada de uma parte. O partido da presidenta é um exemplo de total imersão nesta lógica.

A grande mídia, a princípio, recriminou ou pormenorizou os movimentos, que na Copa das Confederações iniciou-se em Brasília, onde houve severa repressão policial e os acontecimentos foram tratados como uma manifestação em protesto contra a realização da Copa do Mundo. Também fora noticiado amplamente na mídia local a declaração do Secretário de Segurança do DF repercutindo a ação de seus comandados como "perfeita". Entretanto, a análise dos agentes da mídia e dos comentaristas esportivos que vêem com constrangimento as cenas das manifestações, sem saber o que se passa e como comentar as cenas mostradas, acabam por desqualificar o movimento, pois o retratam como um carnaval de copa, ou um grupo de manifestantes pacíficos inseridos por alguns vândalos, que exercem o seu direito democrático de se manifestar. Só não repercutem, obviamente, que um dos motivos de suas manifestações são eles mesmo, sua conduta histórica atrelada a interesses antipopulares, e também que os trabalhadores desses veículos estão acuados e melindrosos, conforme nos mostra Glauco Cortez.

A propósito, o mesmo programa do Danilo Gentili ironiza também o comportamento inicial da mídia e a metamorfose de seu comportamento no decorrente adensamento do movimento. Seria uma tentativa de apaziguamento do seu público consumidor (os pais daqueles jovens que apareciam na televisão) ou transformação disto tudo em um carnaval que está sendo noticiado mundo afora?

Já a nossa presidenta Dilma, vaiada em Brasília juntamente com o Blatter na primeira demonstração pública de insatisfação com toda essa bandalheira, veio a público na tentativa de amansar os ânimos e demonstrar que está atenta à voz que vem das ruas, prometendo a elaboração do Plano Nacional de Mobilidade Urbana, a destinação dos recursos do petróleo para a educação e também a contratação de médicos estrangeiros para trabalharem no SUS. Ou seja, a voz das ruas ressoou nos palácios do poder de formar a ensejar mudanças. É preciso, reitero, que o movimento se organize politicamente para que de forma democrática, no espírito da verdadeira e idealizada democracia, essas reivindicações ganhem corpo e ressonância institucional. Acredito que não basta colocar toda ação política no mesmo balaio de expurgo, pois não o é. E, apesar do jogo já corrompido, nem todo político o é; esse discernimento, é também uma tarefa política.

Das lições desse importante momento histórico eu pesquei algumas. Primeiro, com esse levante ficou provado que o povo não é idiota, já está portando armas (coquetel molotov não é uma delas?) e que o bicho pode pegar ainda mais. Em segundo, a triste constatação de que nossos governos, especialmente do Partido dos Trabalhadores, continuam adotando práticas históricas da direita para justificar o injustificável: a usurpação do patrimônio público, a violência policial, a falta de diálogo com os anseios populares e com as sociedade civil organizada, digo, não aquela aparelhada. Terceiro, nossa mídia, especialmente a esportiva, manifesta-se de forma reacionária e alienada, pois seu editorial encontra-se atrelado a filosofia da décadas de 1960/70, onde predominava no esporte e na educação física a filosofia eugenista e higienista, atrelada ao ufanismo cretino do governo militarista. Um exemplo disso é a declaração do auxiliar técnico Parreira na entrevista coletiva de 21/06/2013, que está acostumado, ou diria treinado, para não misturar política e futebol. Eles construíram e hegemonizam a linha editorial do jornalismo esportivo. Apenas hegemonizam, mas não se apropriaram totalmente.

Pra finalizar, a maior lição que aprendi foi repensar meu papel de consumidor do esporte telespetáculo, conforme anunciou Betti, 1997. Esse autor denuncia como o esporte se relaciona de forma autônoma com a mídia, como se representasse uma entidade com personalidade própria, mas que de fato, é uma leitura dessa manifestação humana como produto de consumo. E altamente rentável. Por isso é deliberadamente alienada ao contexto social, pois esse possui contradições diversas que não são palatáveis ao consumidor. Talvez isso explique a intelectualmente orquestrada desqualificação e alienação das manifestações junto à mídia. E o esporte telespetáculo tem seus "ícones do mal", alguns dele já citados neste blogue. Concluo que mesmo consumindo e se apropriando, é necessário o "diálogo" com esta janela de vidro e, principalmente, a tomada de ação política individual e coletiva de forma crítica, de forma a desembocar em ações de transformação. Ou reprodução, dependendo da identidade coletiva.

E você, o que pensa?


As referências deste post estão em forma de link.